quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Terra fria


Filme: Inverno da Alma (Winter's Bone,2010)
Nota: 8
Para ler escutando: Thistle & Weeds - Mumford and Sons

Para quem escreve sobre cinema e brinca de analisar e criticar, existem três tipos de filmes. Algumas obras te encantam tanto que a escrita de uma crítica se torna uma catarse instantânea. Alguns são tão ruins que sua mente, durante a exibição, já produz várias maneiras criativas, cruéis e irônicas de demonstrar a falta de qualidade daquilo que passeia pela tela. Esses dois primeiros tipos, apesar de representarem dois lados de uma moeda, possuem uma característica em comum: Eles te inspiram de maneira tão intensa que você não precisa de nenhum incentivo ou esforço para separar alguns momentos do seu dia para digitar palavras e formular sentenças. Mas existe um terceiro tipo.

Existem filmes, bons ou ruins (essa não é uma discussão de qualidade), que dificultam a missão do crítico ao não fornecer inspiração alguma. Inverno da Alma foi esse tipo de filme para mim. Mas o que torna Inverno da Alma, um belo filme independente, que carrega interpretações excelentes e uma boa direção, um filme tão pouco inspirador?

Inverno da Alma é uma jornada através de um espaço que não esperamos encontrar em um país de primeiro mundo. Porém, enquanto a realidade daquela terra gelada e miserável, sua crueldade e seu intrincado submundo, surpreendem, o roteiro não consegue o mesmo feito e parece comum demais pra um filme tão elogiado. O mesmo tema foi analisado sob outro prisma em Rio Congelado, de 2009, e a conexão que sentimos com aqueles personagens era bem mais intensa. Enquanto Rio Congelado era movido pelo coração da personagem de Melissa Leo, Inverno da Alma é quase cerebral demais.

Ree Dolly é a menos caricata de uma série de personagens femininos fortes e determinados que o cinema tem produzido, e Inverno da Alma é um filme repleto desses personagens. Interpretada com maestria pela jovem desconhecida Jennifer Lawrence, é a sua busca, seu foco e sua garra que movem o filme. Mas ela não é o personagem mais interessante da película. Enquanto Ree é a mártir sem falhas, entalhada com perfeição de caráter e propósito, seu tio é quem traz mais tridimensionalidade para Inverno Da Alma, em uma performance memorável de John Hawkes. O filme é bem dirigido e bem fotografado, e o ambiente, opressor, simples e gélido, se torna uma extensão dos seus personagens intimidadores.

Inverno da Alma é definido por muitos como um novo "noir" que troca as ruas de uma cidade sombria pelas trilhas das montanhas Ozark, mas é com o grande Western desse ano que podemos traçar mais semelhanças. Em Bravura Indômita, assim como em Inverno da Alma, uma garota decidida e inabalável parte em uma jornada por caminhos perigosos e afastados. Mas o que torna Bravura Indômita inspirador e Inverno da Alma desanimador? Se Mattie Ross é humana e parte na sua jornada com sangue quente, emoções vivas e alma de criança, Ree Dolly é concentrada e árida, e o centro de Inverno da Alma se torna tão frio e sem empatia quanto sua paisagem e seus ameaçadores habitantes.

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