quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
O Preço
Filme: Bravura Indômita (True Grit, 2010)
Nota: 9,5
Para ler escutando: Broken Bells - The High Road/October
"You must pay for everything in this world, one way and another. There is nothing free except the grace of God." Mattie Ross (Hailee Steinfeld)
Na física, nas religiões, na vida de muitos, existe uma lei que declara que "Para toda ação existe uma reação de força equivalente em sentido contrário". Ela pode receber vários nomes. Na física, é uma das leis de newton. Em religiões? Castigo divino, carma. E no mundo concreto dos humanos, é a lei da vingança. Cada ação merece uma retribuição. Todo erro deve ser pago. Para Mattie Ross, nada é mais importante do que vingar a morte de seu pai. Assim, a precoce garota sai em uma jornada sem volta. Mas quem conhece armas de fogo já avisa: A força que impulsiona a bala também proporciona o coice, um empurrão, ainda mais em um corpo leve, despreparado, inseguro. Toda ação tem uma reação.
Mattie Ross inicia sua jornada com um ímpeto infantil, uma teimosia, mesmo que encoberta por muita "maturidade". Mas ela, tão boa de cálculo, falha na contabilidade das consequências de sua trajetória. Ela mesmo descreve seu destino, no início do filme. Tudo deve ser pago, e ela também paga pela sua vingança. Paga fisicamente, paga em inocência e, pelo que percebemos no momento dos créditos finais, paga renunciando a felicidade.
Ao adaptar Bravura Indômita para as telas, dois diretores escolheram dois caminhos completamente diferentes. Henry Hathaway fez um filme de gênero. E conseguiu transformar o material do livro em um clássico do gênero, com humor, beleza e uma grande performance do maior ícone dos Westerns, John Wayne. Mas tudo era domado demais. Sempre havia uma casa segura para os personagens, comida quente, rios, paisagens verdes. Mas para retratar a verdadeira lei do oeste, a retribuição, a violência, essa história pedia por mais aridez. O pedido foi aceito e os Coen fizeram de Bravura Indômita um filme tecnicamente impecável, com fotografia magistral, e, acima de tudo, verdadeira em suas cores sombrias. Humor? Bastante, mas sempre ácido e negro.
Hailee Steinfeld traz uma Mattie Ross muito mais real, tridimensional do que a retratada por Kim Darby. A Mattie de Hailee é menos caricata, e deixa transparecer, por trás de toda a sobriedade de uma garota que anda armada e pensa em vingança, várias camadas de fragilidade e inocência. The Dude vence The Duke, e Jeff Bridges consegue superar John Wayne ao aumentar o grau etílico, o sotaque e os trejeitos de Rooster Cogburn. Matt Damon sabe equilibrar o irritante com o adorável exatamente na medida necessária para ser personagem. Os 3 formam uma família, três solitários que criam laços improváveis.
Um bom fugitivo sabe que pegadas devem ser apagadas, rastros devem ser mascarados, identidades escondidas. Mas os irmãos Coen não estão fugindo de nada, nem mesmo da responsabilidade de criar uma marca, uma identidade pessoal inconfundível. Com alguns segundos na tela, você reconhece as impressões digitais, as marcas deixadas pelos autores e diretores, prontas para afastar qualquer dúvida sobre "Quem dirigiu esse filme?". Alguns diretores preferem deixar o rio correr e serem conhecidos pela variedade. Mas os Coens não são diretores, eles se tornam tão presentes no filme que quase agem como personagens.
O que é a bravura? É um conceito bem diferente de "coragem". O bravo é de certa maneira inconsequente. O bravo pode ser cegado pelo próprio ímpeto, e o bravo paga o preço por ser tão impulsivo e passional. Quem seria o dono da bravura indômita do título? Ela é dividida, em igual medida, entre Mattie e Rooster, e o velho cowboy vê na garota muito de si. Mas os donos da coragem aqui são os Coen, que não se importam em diluir a aridez com a qual vêem o mundo, e fazem de Bravura Indômita mais uma grande obra. Se a bravura é sempre punida, essa coragem deveria ser recompensada.
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