sábado, 7 de agosto de 2010

Maratona aquática




Para ler escutando: Summer '78- Yann Tiersen

Assistir filmes é como nadar. Se você não dedica seu tempo, aprende, se empenha, você fica preso em águas rasas, histórias rasas. Mas não há como aprender a nadar sem, well, nadar. Você tem que se desafiar aos poucos em águas cada vez mais profundas. E nessas histórias mais profundas, você é forçado a mergulhar de verdade. Emoções fortes podem tirar seu fôlego, ou as ondas podem te deixar um pouco perdido ou à deriva em histórias difíceis de entender. Mas só assim você vai ver as belezas que estão longe da superfície. E acima de tudo: Você não pode ter medo de nadar.

Mais ou menos perto do meu aniversário de 17 anos eu comprei a revista “100 filmes essenciais”, uma edição especial da revista “Bravo!”. E ao folhear pela primeira vez, pensei: “Putz, tem muito filme esquisito aqui. Não vou ver nem a metade desse jeito”. Os nomes eram intimidadores. Godard, Truffaut, Fellini, Resnais, Kubrick. Achava impossível assistir tais coisas. Aí eu fui atacando a lista, primeiro pelos mais fáceis.Os mais recentes, os americanos antigos (um melhor que o outro). Quando eu vi, os fáceis estavam acabando. E agora? Abandonar o projeto?

Não fiz isso e realmente não me arrependo. Agora, estou me aproximando da marca de 60% da lista completa, e só tenho boas surpresas. Os clássicos às vezes parecem inacessíveis e assustadores. Mas não são. Eles se tornam clássicos pela sua qualidade e beleza, e se são tão famosos, é porque muitos os amam. Logo, não devem ser tão inacessíveis assim, né?

Comecei minha trajetória pelos caminhos dos cults por Jules & Jim, de Truffaut. Uma escolha estranha e ousada da minha parte, influenciada por um clipe do “Sixpence none the Richer” para Kiss Me, que homenageava o diretor francês. Começar por Nouvelle Vague não é a melhor idéia do mundo, pois desafia a estrutura a qual estamos acostumados, mas Jules & Jim me encantou com seu triângulo amoroso fascinante.

Depois vieram dois italianos, “Roma Cidade Aberta” de Rossellini com sua estrutura quase documental e atuações fortes (um ótimo filme pra começar a ver cinema europeu) e “O Conformista” de Bertolucci, misterioso e insanamente bem dirigido. Pronto, eu já tinha sido conquistada. Eu já não tinha mais medo desses nomes do cinema, e sim respeito e fascinação.

Agora, depois de já ter visto um filme de Godard (“Acossado”, visualmente cool até o osso) como a Mônica da música da Legião, levado um soco no estômago de “Hiroshima Meu Amor” de Resnais e “ O Homem-Elefante” de David Lynch, visto a densidade de uma troca de olhares em Hong-Kong em “Amor à flor da pele” de Wong Kar-wai, entre outros grandes filmes, me apaixonei pelo o que vi da obra de Federico Fellini. Aluguei 8 ½ achando que ia odiar e fiquei boquiaberta com a precisão visual, o jeito frenético dos diálogos e a sinceridade nas mentiras de um diretor que adora fingir que é tudo auto-biográfico. Aí assisti “Noites de Cabíria” e percebi que é extremamente acessível, olha só.

O bom de usar uma lista pra te guiar é que você conhece um pouco de tudo, de cada gênero, de cada autor. E assim você descobre do que gosta e do que não gosta. E quando acabar essa exploração geral pode retomar aqueles diretores que te fascinaram durante o caminho. Ver suas obras completas.

Não vou dizer que alguns nomes na lista não me intimidam mais. Ainda não tenho a mínima vontade de alugar nada do sueco Ingmar Bergman, fujo de Dogville por preguiça e aluguei meu primeiro filme japonês apenas essa semana. Mas fiquei viciada em me desafiar. A emoção de nadar cada vez mais pro fundo do oceano é fantástica. Faz bem subir à superfície várias vezes e aproveitar as belezas de lá (que são muitas, adoro filme grande, blockbuster mesmo). Eu? Vou nadar minha vida inteira, até que meu fôlego acabe. Mesmo assim, não vou conhecer nem 1/10 do oceano que é a arte. E eu te desafio a vir nadar também. A água tá boa!

2 comentários:

  1. Bah, você tem uma habilidade nata pra escrever. Soco no estômago foi a mesma reação que tive com Hiroshima meu amor, masn não tenha preguiça para ver Dogville, é imperdível =P.

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  2. Realmente oito e meio (não sei colocar o meio nesse meu teclado...) é um filme que surpreende, vi a a primeira vez porque minha mãe fez um curso tipo "conhecendo Fellini" e acabei por tabela assistindo a muitos filmes dele (o que eu agradeço muito).
    Também morro de preguiça de Dogville, apesar de já ter escutado críticas positivas.. mas acho que tenho um certo preconceito, assim como também não sou fã de filme japonês.
    Você me falou de Hiroshima, mas ainda não vi..
    E não sei você, mas chorei muito com o Homem Elefante.
    ( ah! o Cara aí de cima tá certa: você escreve muitooooo bem!!!)

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