sexta-feira, 30 de abril de 2010

Espiando através da fechadura


Filmes: Psicose (Psycho, 1960 )
O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs , 1991)

Notas: "Psicose" 10/ "O Silêncio dos Inocentes" 10
Para Ler Escutando: Evil - Interpol

Em um episódio da 2ª Temporada de “A Família Soprano”, o Dr. Kupferberg pergunta à sua paciente, a Dra. Melfi, que se encontra obcecada por seu paciente mafioso, a motivação de uma pessoa ao ir a um parque de diversões, ou a ver um filme de terror. A resposta é clara: Nos sentimos atraídos pelo perigo, e queremos vivenciá-lo sem correr riscos. Assim como para Dra. Melfi, viver alguns momentos dentro da mente de alguém perigoso, de um criminoso, um psicopata, nos traz medo e fascínio simultâneos.
Como resultado dessa curiosidade, os filmes, séries e livros de suspense sempre foram extremamente lucrativos, e por isso, produzidos em quantidades enormes, a cada temporada. Essa produção excessiva leva à filmes que pecam na qualidade, oferecendo sustos baratos e violência gratuita. Mas algumas vezes, aparecem filmes que realmente nos oferecem uma experiência completa, como os impecáveis “Psicose”, do mestre do suspense Alfred Hitchcock, e “O Silêncio dos Inocentes” de Jonathan Demme.
Em “O Silêncio dos Inocentes”, o espectador se identifica com Clarice, a jovem investigadora do FBI que deve realizar um perfil psicológico do Serial Killer e Psiquiatra Dr. Hannibal Lecter. Dr. Lecter possui todas as características de um psicopata anti-social (terminologia psiquiátrica, um oferecimento da Wikipédia, amigos estudantes de psicologia podem puxar minha orelha). Teatral, frio, manipulador e inteligente, o canibal fascina Clarice da mesma maneira que fascina o espectador com seu perigoso magnetismo. Como Clarice ao se deparar com a porta do celeiro fechada e os gritos de agonia dos cordeiros, o medo serve de alerta para que desviemos nossos olhares, mas é impossível. E então, somos apresentados a outro Serial Killer, Buffalo Bill, uma figura repulsiva e misteriosa que, juntos com Clarice e Dr. Lecter, somos convidados a analisar. O psiquiatra diz para a jovem agente que para encontrar o assassino, ela deve se perguntar: O que ele é? Qual é a sua natureza? O que ele faz? Qual necessidade ele supre ao matar sua vítima?

Essas são as perguntas que nos fazemos quando acompanhamos a trajetória de um criminoso na tela grande. Ás vezes não conseguimos respondê-las, como disse Alfred Pennyworth em “O Cavaleiro das Trevas”, alguns homens apenas querem ver o mundo em chamas. Esses são os mais assustadores, pois não é possível prever seu próximo movimento. Em outros, suas motivações são mais perceptíveis, como em Norman Bates, lendário protagonista de Psicose, de Hitchcock. Norman Bates é um homem solitário e aparentemente gentil, que esconde problemas psicológicos graves, que, com o decorrer do filme, vamos desvendando, até que um psiquiatra confirma todas as nossas suspeitas.
Um bom filme de suspense depende mais de uma boa direção do que a maioria das obras de outros gêneros. Afinal, a arte aqui é criar uma atmosfera, ocultar, iludir, e manter a tensão o tempo inteiro, para dar ao público exatamente o que ele anseia. Alfred Hitchcock conhecia tanto a natureza do espectador de um filme de suspense que “Janela Indiscreta”, uma de suas maiores obras, analisa exatamente essa curiosidade e o anseio pelo perigo. Hitchcock era um mestre ímpar na arte do suspense, e Psicose (assim como outras obras suas) continua relevante e moderno, pois pavimentou o caminho de inúmeros thrillers da atualidade. O diretor, com uma iluminação de alto contraste e ângulos inovadores, deixa o espectador grudado no assento, mesmo diminuindo o ritmo em alguns momentos, como na cena em que Norman se livra dos vestígios do crime, importante para a construção da personalidade do assassino mas que muitos diretores da atualidade não fariam, para não entediar a platéia ávida por ação e carnificina.Jonathan Demme também realiza um filme genial, perturbador, que se torna mais que um filme, uma experiência completamente imersiva.A cena da perseguição final é indescritível. Em ambos, cada cena parece ter seu propósito exato, cada frame, cada fala.

Também impecável é o elenco das obras. Jodie Foster e Anthony Hopkins dão duas das melhores interpretações que eu já vi, e criam uma dinâmica explosiva entre os personagens. No filme de 1960, Anthony Perkins cria o assassino mais emblemático de todos os tempos, indo do tímido e pacato ao enlouquecido e perverso. São tantos elogios, que eu poderia escrever páginas sobre essas duas obras. Não consigo apontar falhas significativas, o que garantiu aos dois clássicos as duas primeiras notas 10 presentes no blog.
Crawford, chefe de Clarice no filme de Jonathan Demme, alerta a destreinada agente para que não deixasse Hannibal Lecter “entrar” em sua mente. É com o alívio de que nossos corpos e mentes permanecerão intactos e seguros depois de aproximadamente 2 horas em uma escura sala de cinema, que nos aventuramos pelos labirintos da mente de um monstro.

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